quarta-feira, 1 de julho de 2015

Cris e Chris, eu e você


A morte é sempre triste. Em todas as situações, momentos, causas e motivos. Quando a vítima é alguém famoso, na flor da idade e perde a vida de maneira violenta, é ainda mais chocante. Foi o que aconteceu com o cantor Cristiano Araújo, falecido no último dia 24 de junho, aos 29 anos, vítima de um acidente de trânsito.

Vou ser sincero com vocês: eu nunca tinha ouvido falar em Cristiano Araújo. Essa afirmação não tem nada de arrogância ou seja lá o que possam pensar, mas eu realmente não fazia ideia de quem era Cristiano Araújo. E me surpreendeu o fato de que um completo desconhecido neste meu mundinho particular era um dos maiores nomes da música jovem brasileira, ídolo de milhões de pessoas Brasil afora. Sua perda doeu fundo em milhões de fãs, e esse sentimento deve ser respeitado e jamais desprezado.

O fato de eu nunca ter ouvido falar de Cristiano Araújo vai muito além de não consumir o estilo de música que ele produzia. Eu não sou fã de sertanejo universitário, mas conheço alguns nomes do estilo, como Michel Teló, Gusttavo Lima, Jorge & Matheus. Mas nunca tinha ouvido falar de Cris. E aí entram outros aspectos bastante singulares. Não assisto TV aberta, por exemplo. Nenhum canal. É uma escolha que tomei por achar tudo muito fraco. Fico lá nos meus canais de esporte, nos Discoverys e Historys da vida, na HBO e afins. E nesses canais, nunca vi nada a respeito de Araújo. Os sites que acesso ou são de um estilo musical distante do praticado pelo falecido, ou trazem matérias sobre cultura pop, quadrinhos, cinema e outros assuntos do meu interesse. As revistas que leio são HQs, algumas de esporte, de vez em quando uma ou outra sobre música. Minhas timelines no Twitter e no Facebook ficam nestes assuntos, com um processo contínuo de seleção para mantê-las livres de qualquer coisa próxima a preconceito, imagens de mortes e acidentes, fanatismos diversos e o que mais entorte o meu estômago.

Me impressionou o fato de uma pessoa que eu não fazia ideia de quem fosse ser, na verdade, um ícone, um artista popular pra caramba, e, como tal, a sua morte ter batido tão forte no coração de um número enorme de pessoas. E isso faz pensar. Faz pensar em como o Brasil é um país imenso, com diferentes realidades e culturas em suas regiões. Quem é popular em um local, pode ser um completo desconhecido em outro. No entanto, Cristiano Araújo era popular em todo o país. Então essa teoria já cai por terra. E vamos para os nichos de consumo, que caminham lado a lado, de forma paralela, com as diferentes parcelas da população. Enquanto o amigo da mesa à frente curte o seu sertanejo universitário, o cara ao lado mergulha no metal e o mais à esquerda curte suas canções românticas. E todo um universo se abre em cada um destes estilos, universos que são praticamente desconhecidos por quem está aí, ao seu lado e bem perto de você. E não há nada de errado nisso.

Me incomodou um pouco a postura que li em diversas matérias e comentários, com pessoas indignadas pelo fato de um grande número de pessoas, dos quais faço parte, nunca terem ouvido falar de Cristiano Araújo antes de sua morte. Como se fosse proibido não conhecer o finado cantor. Pois é, isso acontece, e é perfeitamente normal. Como já disse, cada um tem os seus próprios hábitos de consumo, e dentro de cada um deles existem ícones que possuem um enorme significado dentro daquele nicho, e não representam nada fora dele. 

Podemos fazer um exercício com outro músico falecido recentemente, um quase homônimo do Cris que parou o Brasil: Chris Squire, baixista do Yes. O Yes é uma banda inglesa formada nos anos 1960 e na ativa até os dias de hoje. O grupo é um dos pilares do rock progressivo, gênero marcado por canções repletas de movimentos ousados, mudanças de climas e que tem, entre as suas principais características, a notável técnica de seus instrumentistas. Chris Squire era membro fundador e baixista do Yes. Um ícone do contra-baixo, reconhecido mundo afora como um dos maiores músicos do gênero. Squire faleceu em 27 de junho, aos 67 anos, vítima de leucemia. E, assim como a perda de Cristiano Araújo fez com seus fãs, deixou um enorme vazio nos milhões de admiradores do Yes mundo afora. 

Eu nunca tinha ouvido falar de Cristiano Araújo. Assim como é bem provável que a grande maioria dos fãs do Cris que parou o Brasil jamais tenham escutado o nome de Chris Squire. Dois músicos que encheram de alegria a vida de seus fãs, cujas canções estão nos corações de milhões de pessoas. Um não vale mais do que o outro, assim como o outro não vale mais do que o um. Ambos seres humanos, cujas perdas devem ser lamentadas. Ambos nomes importantes em seus universos, e completos desconhecidos fora deles.

Meus sentimentos aos órfãos de Cristiano Araújo. Minhas condolências aos que sentem saudades de Chris Squire. E o meu desejo de saúde e uma vida boa e repleta de alegrias não apenas para quem curte música, mas também para os artistas que nos fazem amar esta arte maravilhosa, que esquenta o coração e alimente a alma. Seja através do sertanejo universitário, do rock progressivo ou de qualquer outro gênero.


Um comentário:

  1. Belo texto Ricardo. O que há é muita intolerância, de todos os lados. Aprendi desde cedo com minha família, que a melhor qualidade da arte é a liberdade. Enquanto temos regras sociais, profissionais e outras tantas, a arte (música pra mim) é completamente livre. Posso ouvir o que eu quiser, quando quiser, da forma que tiver vontade. É o que eu acho mais fascinante. Por isso não vejo com bons olhos quem tenta censurar o gosto alheio. Parece que querem criar regras e tornar "culto", algo que é pura diversão e manifestação natural.

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