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quarta-feira, 16 de setembro de 2015

Opinião: o jazz como ferramenta para a evolução do ouvinte

11:21

Sempre escutei rock. Desde que comecei a consumir música de maneira contínua e diária, o rock sempre foi o protagonista. A trilha da minha adolescência foi formada por doses cavalares de Black Sabbath, Iron Maiden, Metallica, Led Zeppelin, Beatles e outros ícones. E seguiu nessa toada ano após ano. Apesar de sempre ter mantido o ouvido curioso - adoro pop, por exemplo -, ele ficou limitado ao universo do rock e do metal.

Mas o jazz sempre andava por ali. De tempos em tempos, tentava dar uma experimentada, uma degustada no gênero, mas a sensação era sempre indigesta. A impressão constante era a de que cada um dos músicos estava tocando uma canção diferente do outro. Que os instrumentos não combinavam. Que a coisa não batia e não funcionava.

Anos e anos tive essa sensação em relação ao jazz. Até que 2008 chegou. Estava com 34 anos e meu filho acabara de nascer. O Matias trouxe uma alegria indescritível. E, junto com ela, uma maturidade necessária e muito bem-vinda. E que, até que enfim, foi capaz de me fazer entender o jazz, traduzi-lo para os meus ouvidos.

Dois discos foram os responsáveis por essa transformação, ambos, curiosamente, lançados no mesmo ano: 1959. Falo de Time Out, do Dave Brubeck Quartet, e de Kind of Blue, de Miles Davis. Através destes dois títulos, o jazz se tornou entendível para mim. E isso se deu pela acessibilidade da dupla, já que estamos falando de dois álbuns que, mesmo possuindo as refinadas estruturas harmônicas características do jazz, fazem a tradução destes elementos de forma fácil ao ouvinte leigo. 

Time Out é um álbum matemático. Suas composições evoluem em arranjos marcados que caminham de compasso em compasso, em melodias crescentes. O grande clássico do disco é a imortal “Take Five”, uma das canções mais conhecidas do estilo, e uma porta de entrada perfeita para quem nunca experimentou o gênero.

Kind of Blue marca o nascimento do jazz modal, estilo onde as melodias se desenrolam em camadas suaves e intercaladas, que servem de base para os vôos solos dos instrumentistas. No caso deste título específico, o genial Miles Davis estava ao lado de outro músico singular, o saxofonista John Coltrane, e ambos entregam performances divinas no disco. 

Um parágrafo destinado apenas para um adendo focado no fã de rock: ao contrário do que ouvimos nos discos do estilo que tanto amamos, onde, na grande maioria dos casos, cada instrumento é gravado de forma separada, com a mixagem unindo tudo, no jazz a coisa é feita de outra forma. Com todos os músicos reunidos no estúdio, a canção é executada uma, duas, quantas vezes se achar necessário até alcançar a perfeição, com todos tocando juntos. Tudo fica mais espontâneo e verdadeiro, ao meu ver.

Partindo de Time Out e Kind of Blue, mergulhei em diversos outros artistas e discos. Thelonious Monk virou meu parceiro, Stanley Clarke me mostrou que o baixo poderia alcançar outro nível, Herbie Hancock remexeu profundamente o meu esqueleto. Tudo isso em um processo que colocou o jazz entre os meus gêneros favoritos de música.

O que isso tem a ver com o rock? O que isso tem a ver com você que está lendo este texto e é um fã do bom e velho rock and roll, das guitarras pesadas do heavy metal e da força da música pop? Pegando como base a experiência que vivi - e continuo experimentando - com o jazz, o que posso afirmar é que o gênero quebrou barreiras e alargou as minhas percepções pessoais sobre a música. Ao caminhar por estruturas livres e sempre buscar a experimentação e a inovação, seja através de andamentos inusitados ou arranjos que almejam novas formas de decodificar a música, o jazz me levou para muito além do 4x4 tradicional do rock. Esse passo além me ajudou não apenas na atração por artistas que procuram fugir do convencional, como também foi essencial para um entendimento mais profundo e completo da obra de bandas que já eram importantes..

Meu entendimento sobre o Clash, por exemplo, mudou completamente após a inserção do jazz na minha vida. Se antes eu já adorava a banda, após fiquei ainda mais impressionado pela intensa musicalidade dos britânicos. O mesmo vale para os Beatles, que caminharam de composições simples para faixas onde o experimentalismo era onipresente, e sempre mantendo a capacidade saudável de fazer tudo soar acessível.

Sou da opinião de que, quanto mais você faz uma coisa, melhor você fica naquilo. É o caso da música. Quanto mais você ouve, mais você aprende. Quanto mais você é exposto e se deixa experimentar gêneros que fogem do seu cardápio habitual, mais elementos agrega ao seu vocabulário. E, nesse sentido, o jazz possui um valor incrível como catalisador de novas possibilidades.

Ouça jazz. Ouça rock. Ouça o que você quiser. Mas sempre com o ouvido curioso e destemido. Deixe a música revelar toda o seu esplendor. É demais sentir essa sensação, eu garanto.


quarta-feira, 9 de setembro de 2015

Opinião: Lemmy e a hora de parar

19:05

Há uma crença que diz que é muito difícil para o artista saber a hora exata de parar. Alguns param muito cedo. Outros, deixam passar o momento e mergulham em uma espiral de decadência que macula, sem dó e nem piedade, uma imagem que levou anos para ser construída. Poucos, muito poucos, tem a sabedoria para saber a hora exata de pendurar as chuteiras.

Ao que tudo indica, não parece ser o caso de Lemmy Kilmister, vocalista, baixista, cara, corpo e coração do Motörhead. O lendário músico inglês passa por sérios problemas de saúde já há algum tempo, e se nega a alterar a sua rotina em prol de uma vida mais longa. O que isso gera? Cancelamento de shows, apresentações públicas onde fica evidente o lamentável estado em que Lemmy se encontra, causando, invariavelmente, a comoção coletiva dos fãs.

Deixando todos os romantismos de lado e empurrando para baixo do tapete a figura hipotética do ídolo invencível, é deprimente ver o papel ao qual Lemmy se deixa passar. Ok, alguém irá dizer que cada um faz as suas escolhas, que “é legal” morrer no palco e outros pensamentos egoístas que só fazem sentido para quem não é o protagonista da descida ladeira abaixo. Para essas pessoas, respondo que, ao meu modo de ver, a escolha do artista em “morrer pela arte” ou através dela me parece estúpida e, pra combinar com a sentença anterior, igualmente egoísta. 

Envelhecer aos olhos do público - e junto com ele - é um processo necessário e inevitável em qualquer arte, que o digam atores, escritores e outros talentos dos mais diversos segmentos. Na música, é fácil perceber como nomes do gabarito de Bruce Springsteen, Paul McCartney, os Rolling Stones, Neil Young, David Gilmour e outros souberam colocar a passagem do tempo embaixo do braço e se adaptaram à ela. Assim como também são facilmente estampados aos olhos do público, de maneira nada agradável porém explícita, exemplos de artistas que não souberam conviver com as limitações - e, consequentemente, com a sabedoria - que os anos trazem. E tome Sebastian Bach passando vergonha por não admitir que não tem mais 20 anos, Dinho Ouro Preto agindo como um adolescente mimado e pseudo-revoltado cujo vocabulário se resume à palavra “caralho”, entre outros.

Lemmy vai por um caminho um pouco diferente, e ainda mais doloroso para quem admira o seu trabalho. Respeitando a proporção, é um caso não tão distante do que vimos, há algum tempo, com a falecida Amy Winehouse. Enquanto a ótima cantora inglesa definhou em praça pública em um furacão turbinado por doses industriais de álcool e drogas, Lemmy paga o preço de décadas de uma dieta resumida, praticamente, a whisky, Cola-Cola e maços de Marlboro. Não sei se o motivo para tal exposição - ao meu ver totalmente desnecessária - venha da instabilidade econômica vivida por Lemmy, como alguns veículos chegaram a levantar. O fato é que o músico, que do alto dos seus 69 anos possui o status de lenda e ícone do rock e do heavy metal, demonstra uma fragilidade gritante e cada vez maior dia após dia. E, seguindo nesse ritmo, Mr. Kilmister inevitavelmente conseguirá alcançar aquele que parece ser o seu objetivo final: cair duro e morto em pleno palco, a palmos de distância do seu público.

Que o Motörhead siga gravando seus discos. É bom e necessário ouvir Lemmy soltando a voz e espancando o seu baixo. É uma sensação vibrante e saudável. Mas também é bem mais inteligente manter-se vivo, curtindo os merecidos méritos dos inúmeros bons serviços prestados à música. 

A escolha é sua, Lemmy. Só desejo que você tenha sabedoria e lucidez para tomá-la.

terça-feira, 1 de setembro de 2015

Opinião: o mundo não precisa de um retorno do Guns N’ Roses

19:09

Parece uma daquelas manchetes de revistas de fofocas, e em muitos aspectos é isso mesmo. Vamos lá: nas últimas semanas, dezenas, centenas, milhares de sites/veículos em todo o mundo noticiaram que Slash fez as pazes com Axl Rose. O que, logicamente, deu origem a um sem número de rumores sobre o possível retorno da formação clássica da banda.

O Guns N’ Roses merece um estudo, e bem profundo. A rigor, a banda gravou apenas três discos, sendo que o último registro relevante do grupo saiu há praticamente 25 anos - em 1991, um quarto de século atrás. É inegável a importância que o quinteto teve durante a década de 1980 e início dos anos 1990, isso é inquestionável. Appetite for Destruction, lançado em 21 de julho de 1987, é uma das maiores e melhores estreias da história do rock. Unindo Led Zeppelin e Aerosmith em um mesmo caldeirão, Axl e sua turma gravaram o disco definitivo do glam rock oitentista e um dos grandes álbuns da história do hard rock. E, de lambuja, redefiniram estereótipos, reescrevendo a trama e a atuação de personagens emblemáticos como o vocalista superstar e o guitar hero enigmático.

Então, um EP com outtakes e versões ao vivo para acalmar o mercado, enquanto os integrantes bebiam, cheiravam e transavam com todas as menininhas da cidade. G N’ R Lies (1988) acabou ganhando uma proporção exagerada, levado pelo enorme sucesso de “Patience”, sua principal faixa. Mais combustível para turnês intermináveis, muita grana no bolso e exageros de toda parte.

E essa megalomania culminou nos dois volumes de Use Your Illusion, que chegaram às lojas de todo o planeta em 17 de setembro de 1991. Mas, apesar do exagero de lançar dois álbuns duplos de maneira simultânea, revelando nada mais nada menos do que 30 novas canções, ao mesmo tempo, para os fãs, o Guns conseguiu conceber dois registros recheados de faixas fortes, que solidificaram o status do quinteto como a maior banda de rock do mundo.

Foi então que tudo começou a desabar. Embalados por doses industriais de ego, bebida e drogas, Axl entrou em conflito com Slash, que brigou com Duff, que brigou com o empresário, que saiu fora... Um monte de confusão. O GNR ainda liberaria o disco de covers The Spaghetti Incident? em 1993 e o ao vivo Live Era ’87-’93 em 1999, ao mesmo tempo em que, um por um, os músicos iam saindo fora do barco. Bye bye Slash, adeus Duff, tchauzinho Matt e todo mundo.

Só restou Axl. Que embarcou em uma jornada épica de mais de uma década, culminando no desastroso Chinese Democracy, lançado em 2008. Ao seu lado, uma enorme banda com três guitarristas e mais um monte de gente, rodando o mundo em apresentações destinadas aos fãs, sedentos por assistir ao vivo a magia que ficou perdida nos anos 1980.

E daí vem essa história de uma possível reunião da formação clássica da banda, com Slash e Duff ao lado de Axl novamente. Sério, gente? A cultura do classic rock é realmente muito nefasta, olhando apenas para o passado e desprezando praticamente tudo que seja produzindo hoje em dia - com exceção, adivinha, dos nomes que entregam uma sonoridade considerada “clássica”. O mundo anda pra frente, e é assim que a gente evolui. É inegável o impacto e a influência do Guns na história do rock, isso ninguém discute. Mas, o que também ninguém discute - com a provável exceção dos mais fanáticos - é que é impossível reviver a força e tudo mais que ficou perdido anos atrás.

Axl Rose tinha 25 anos em 1987. Hoje, tem 53 anos e não consegue cantar como antes, há tempos. Izzy Stradlin, principal compositor da banda, vive os seus cinquenta e tantos anos longe dos holofotes, e por escolha própria. O cinquentenário Duff está mais magro e tem uma vida saudável com seus discos solo, em um contraste violento com a figura inchada e sempre bêbada de 25 anos atrás. Slash tem gravado bons álbuns ao lado de Myles Kennedy, e, musicalmente, tem entregado discos bem interessantes. E Steven Adler virou um frequentador assíduo de programas tipo Celebrity Rehab.

Assim como Axl, Slash, Duff, Izzy e Staven mudaram muito nesse tempo todo, você também mudou. Cresceu, amadureceu, evoluiu. Descobriu novos sons, teve novas prioridades em sua vida. O Guns foi legal, mas é uma coisa do passado, de um tempo que não volta mais. Desejar com um retorno da banda, como se isso fosse trazer de volta toda a magia de décadas passadas, é como acreditar em Papai Noel e outras bizarrices.

Bola pra frente, gente. A fila anda, e a vez do Guns já passou, faz tempo...

segunda-feira, 31 de agosto de 2015

Opinião: os fantasmas se divertem

11:12

O mundo do heavy metal, muitas vezes, é bastante semelhante a uma competição frenética. Estão lá milhares de Usains Bolts tentando soar uns mais rápidos que os outros, transformando estilos mais extremos em uma corrida sem sentido e pra lugar nenhum. É possível encontrar o hype desgovernado e exacerbado, que embala guitarras agudas e a aproximação com o shoegaze na fórmula mágica que eleva uma banda desconhecida para o status de cult (alguém aí falou Deafheaven? Alguém?). Está lá o culto exagerado ao passado, às mesmas fórmulas já testadas e que deram certo milhões de vezes, em detrimento ao experimentalismo e à aproximação com outros estilos, principalmente os considerados mais acessíveis e “comerciais" (aliás, essa palavra assusta os fundamentalistas do heavy metal mais que a figura do cramulhão em pessoa).

Nesse rolo todo, onde nomes consagrados percebem que é muito mais vantajoso fazer turnês intermináveis com praticamente o mesmo setlist (o Metallica, por exemplo, acabou de bater o recorde de público da história da Suécia, colocando mais de 60 mil pessoas no Ullevi Stadium, em Gotemburgo) do que entrar em estúdio e gravar canções inéditas, e onde os poucos que decidem registrar suas novas ideias são cobrados explicitamente por não soarem "como deveriam soar" (tá aí o Iron Maiden experimentando em seus últimos quatro discos e sendo mal recebido por uma grande parcela dos fãs, que ainda esperam que eles soem, do alto de seus 60 anos de vida, como soavam quando tinham vinte e poucos anos e gravaram Powerslave), o Ghost é um ponto fora da curva. E ainda bem que é assim.

A banda sueca, que os mais preguiçosos teimam em resumir ao aspecto visual e a uma suposta semelhança com o Mercyful Fate (e que, na verdade, musicalmente está muito mais próxima do Blue Öyster Cult do que da trupe de King Diamond), é muito inteligente. E usa essa característica ao olhar para o passado e pinçar, com rara maestria, aspectos sonoros de décadas anteriores, utilizados na construção de uma sonoridade refrescante, atual e contagiante. E, acima de tudo, extremamente contrastante com a correria e a busca pela agressividade cada vez mais extrema que pautam o metal atualmente.

Isso faz o Ghost ser uma banda diferente. E, como todo mundo sabe, quem é diferente se destaca em um mundo de iguais. Embalados pelo visual ao mesmo tempo macabro e fascinante, lição aprendida de maneira exemplar com ícones como Alice Cooper e Kiss, o Ghost consegue produzir uma música de inegável qualidade. Isso já havia ficado claro nos dois primeiros discos do grupo - o surpreendente Opus Eponymous (2010) e o ótimo Infestissumam (2013) - e é outra vez evidente em Meliora, terceiro álbum do sexteto, lançado na última semana.

O trabalho equilibra aspectos dos dois registros anteriores. Há a espontaneidade da estreia, evidente em faixas como “Spirit" e “From the Pinnacle to the Pit”, e também a saudável vontade de experimentar e tentar novos caminhos de Infestissumam, percebida em faixas como “Cirice”, “He Is” e “Deus in Absentia”. A banda, como já havia feito em seu segundo álbum, não se prende aos limites estilísticos do heavy metal, e mete o pé sem medo na psicodelia, no prog e até mesmo no pop. E é justamente essa atitude, essa coragem e essa postura destemida que fazem com que o Ghost brilhe e se sobressaia cada vez mais.

Com Opus Eponymous, Infestissumam e Meliora, os suecos liderados por Papa Emeritus criaram uma trilogia ao mesmo enigmática e apaixonante. Uma história que a cada disco, a cada passo, conduz a banda em uma trajetória ascendente, conquistando um número cada vez maior de corações e mentes.

segunda-feira, 17 de agosto de 2015

Opinião: Iron Maiden e a comoção coletiva

16:20

Faça um exercício e conte comigo: quantas bandas/artistas são capazes de causar uma comoção coletiva ao revelar ao mundo o seu novo single? Quais nomes da música tem tamanha força, popularidade e impacto ao ponto de literalmente parar tudo nos grandes veículos do planeta ao anunciarem ao mundo a sua nova canção? Poucos, nós dois sabemos disso. Um grupo seleto, onde podemos incluir os Stones, David Bowie, U2 e mais alguns. Dentro do metal, apenas três gigantes possuem este poder: Black Sabbath, Metallica e Iron Maiden. Mais uma prova disso foi dada semana passada, quando o Maiden divulgou “Speed of Light”, primeira amostra de seu novo disco, The Book of Souls, que chegará às lojas em setembro.

E a euforia foi tamanha que dificultou uma análise fria e imparcial sobre a canção. O torpe foi instantâneo, embaralhando a visão e confundindo o cérebro dos fãs, como sempre. Não sei se é o tempo, não sei se é a vida, não sei o que pode ser, mas o fato é que, pela primeira vez desde que me conheço por gente, uma nova canção do Iron Maiden não mexeu, bagunçou e esculhambou os meus dias. 

Pra ficar mais fácil de entender, um pouco da minha história com a banda. Ouvi o Iron Maiden pela primeira vez em 1985, na TV, durante o primeiro Rock in Rio. Desde então, a banda se transformou na minha preferida. O Maiden foi o grupo que mais escutei na vida, fácil. Passei anos e anos, que depois se transformaram em décadas, levando seus discos literalmente embaixo do braço para todo e qualquer lugar que fosse. Ouvi tanto que minha mãe assobiava as faixas da Donzela inconscientemente. O Maiden é a banda que mais tenho discos, e ocupa a maior parte da minha coleção (na última contagem, há alguns meses atrás, havia lá em casa uns 150 itens da banda, entre CDs, DVDs, livros e afins). Tenho um filho de 7 anos, e passei a paixão adiante, quase de maneira hereditária. Como diz um amigo, Iron Maiden é vida.

Só que não. Não ao escutar “Speed of Light”. Em um primeiro contato, achei a faixa naquela linha mediana dos singles que anteciparam todos os singles lançados pelos ingleses desde o retorno de Bruce Dickinson e Adrian Smith ao grupo, em fevereiro de 1999 - a saber: “Wildest Dreams”, “The Reincarnation of Benjamin Breeg” e “El Dorado”, faixas que não representam grande coisa no imenso catálogo da banda. O ponto fora da curva foi justamente o primeiro destes singles, “The Wicker Man”, que entrou com força e de maneira definitiva no coração dos fãs. O Iron Maiden soa genérico e com pouca inspiração em “Speed of Light”. Um riff comum abre a faixa, seguida por um grito meio “Be Quick or Be Dead” de Bruce. Depois, linhas vocais mais do mesmo, um refrão sem graça e é isso aí. Pra não dizer que tudo se perde, os solos de guitarra, principalmente o de Adrian Smith, garantem a diversão e um tímido sorriso de satisfação.

Muito pouco para uma banda como o Iron Maiden. E, principalmente, muito pouco pelo tamanho da comoção causada. A sensação é que, mesmo lançando qualquer coisa, o buzz estará garantido. Já disseram uma vez que todo fã é um idiota. Não concordo. Porém, a ausência da capacidade de avaliação proporcionada pelo fanatismo e pela paixão impedem que grande parte dos fãs do Maiden percebam o óbvio: “Speed of Light” é, na melhor da hipóteses, apenas um arremedo do que se espera do Iron Maiden, e do que a própria banda pode entregar. Steve Harris e Bruce já declararam que a ideia em The Book of Souls foi gravar tudo ao vivo no estúdio, capturando a energia e a espontaneidade das primeiras execuções. Algo parecido com a busca por algo mais básico que a banda entregou em No Prayer for the Dying, um dos seus piores álbuns.

O fato é que um single não representa, necessariamente, a amostra de um disco. No máximo, revela o clima e o astral que a banda estava ao gravá-lo. O próprio Iron Maiden é uma prova disso. Seu último trabalho, The Final Frontier (2010), é um dos melhores da longa carreira dos ingleses, e traz uma sonoridade refrescante e renovada, culminando em uma canção excelente como “When the Wild Wind Blows”. Ou seja, pode vir por aí um grande disco, mesmo com uma prévia tão decepcionante.

Mas vale a pena levantar a questão: tanto barulho por tão pouco? Tantos “Iron Maiden é a minha vida” por uma canção genérica ao extremo? O fã pode não ser idiota, mas, com absoluta certeza, passa longe da isenção. E essa postura gera uma posição de extremo conforto para o artista. Ele sabe que basta gravar qualquer coisa que venderá, cairá na graça de sua enorme legião de fãs, venderá pra caramba e encherá arenas em seus shows - tocando clássicos antigos, é claro. É preciso mais “The Chemical Wedding” e menos “Speed of Light”. É preciso mais álbuns inovadores e que saiam do comum, que experimentem, que inovem, e (muito, muito mesmo) menos discos que apenas reciclem ideias do passado. É preciso menos classic rock e mais música inspirada e corajosa. 

E, acima de tudo, é preciso medir nossa emoções e não entrar em transe coletivo por tão pouco. 

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