segunda-feira, 31 de agosto de 2015

Opinião: os fantasmas se divertem


O mundo do heavy metal, muitas vezes, é bastante semelhante a uma competição frenética. Estão lá milhares de Usains Bolts tentando soar uns mais rápidos que os outros, transformando estilos mais extremos em uma corrida sem sentido e pra lugar nenhum. É possível encontrar o hype desgovernado e exacerbado, que embala guitarras agudas e a aproximação com o shoegaze na fórmula mágica que eleva uma banda desconhecida para o status de cult (alguém aí falou Deafheaven? Alguém?). Está lá o culto exagerado ao passado, às mesmas fórmulas já testadas e que deram certo milhões de vezes, em detrimento ao experimentalismo e à aproximação com outros estilos, principalmente os considerados mais acessíveis e “comerciais" (aliás, essa palavra assusta os fundamentalistas do heavy metal mais que a figura do cramulhão em pessoa).

Nesse rolo todo, onde nomes consagrados percebem que é muito mais vantajoso fazer turnês intermináveis com praticamente o mesmo setlist (o Metallica, por exemplo, acabou de bater o recorde de público da história da Suécia, colocando mais de 60 mil pessoas no Ullevi Stadium, em Gotemburgo) do que entrar em estúdio e gravar canções inéditas, e onde os poucos que decidem registrar suas novas ideias são cobrados explicitamente por não soarem "como deveriam soar" (tá aí o Iron Maiden experimentando em seus últimos quatro discos e sendo mal recebido por uma grande parcela dos fãs, que ainda esperam que eles soem, do alto de seus 60 anos de vida, como soavam quando tinham vinte e poucos anos e gravaram Powerslave), o Ghost é um ponto fora da curva. E ainda bem que é assim.

A banda sueca, que os mais preguiçosos teimam em resumir ao aspecto visual e a uma suposta semelhança com o Mercyful Fate (e que, na verdade, musicalmente está muito mais próxima do Blue Öyster Cult do que da trupe de King Diamond), é muito inteligente. E usa essa característica ao olhar para o passado e pinçar, com rara maestria, aspectos sonoros de décadas anteriores, utilizados na construção de uma sonoridade refrescante, atual e contagiante. E, acima de tudo, extremamente contrastante com a correria e a busca pela agressividade cada vez mais extrema que pautam o metal atualmente.

Isso faz o Ghost ser uma banda diferente. E, como todo mundo sabe, quem é diferente se destaca em um mundo de iguais. Embalados pelo visual ao mesmo tempo macabro e fascinante, lição aprendida de maneira exemplar com ícones como Alice Cooper e Kiss, o Ghost consegue produzir uma música de inegável qualidade. Isso já havia ficado claro nos dois primeiros discos do grupo - o surpreendente Opus Eponymous (2010) e o ótimo Infestissumam (2013) - e é outra vez evidente em Meliora, terceiro álbum do sexteto, lançado na última semana.

O trabalho equilibra aspectos dos dois registros anteriores. Há a espontaneidade da estreia, evidente em faixas como “Spirit" e “From the Pinnacle to the Pit”, e também a saudável vontade de experimentar e tentar novos caminhos de Infestissumam, percebida em faixas como “Cirice”, “He Is” e “Deus in Absentia”. A banda, como já havia feito em seu segundo álbum, não se prende aos limites estilísticos do heavy metal, e mete o pé sem medo na psicodelia, no prog e até mesmo no pop. E é justamente essa atitude, essa coragem e essa postura destemida que fazem com que o Ghost brilhe e se sobressaia cada vez mais.

Com Opus Eponymous, Infestissumam e Meliora, os suecos liderados por Papa Emeritus criaram uma trilogia ao mesmo enigmática e apaixonante. Uma história que a cada disco, a cada passo, conduz a banda em uma trajetória ascendente, conquistando um número cada vez maior de corações e mentes.

Um comentário:

  1. eu acho o sunbather do deafheaven melhor play de 2013...
    o hype é justo. rsrs

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