sexta-feira, 29 de maio de 2015

A estreia solo de Eric Clapton

18:00

Como nasce um ídolo? Existe uma fórmula para criar um pop star? Vivemos em tempos estranhos, em que o termo pop vem carregado muito mais de aspectos negativos do que positivos.

A música pop, em sua essência, é aquela que faz você feliz, coloca um sorriso no seu rosto e faz você cantar sem parar um refrão que não sai tão cedo da cabeça. Mas, para a maioria das pessoas que gostam de música, atualmente o pop é aquilo que artistas fabricados em série fazem, um som totalmente descartável e apenas com propósito comercial. O negócio é vender! É a música tratada como produto e nada além disso. Ou seja, algo que não combina, em hipótese alguma, com o nosso bom e velho rock and roll.

Mas esse assunto fica para outro dia. A pergunta aqui é: como nasce um Deus? Eric Patrick Clapton foi o primeiro dos guitar heroes. Antes mesmo do advento de Hendrix, Clapton já hipnotizava os ingleses. Todo mundo conhece a história do muro pichado com a frase "Clapton is God". Considerado o maior guitarrista do planeta durante sua passagem pelos Bluesbreakers de John Mayall e elevado à santidade durante o período em que esteve à frente do Cream, Clapton passava, no início dos anos setenta, por uma fase de transição em sua carreira.

Ainda vivendo a ressaca do Blind Faith, que, apesar de ter gravado um primeiro e único disco fantástico não emplacou comercialmente, Clapton não se sentia pronto para cair na estrada novamente. Com disposição de sobra para mostrar ao mundo que ainda estava vivo (o que viria a fazer inúmeras vezes durante as décadas seguintes), reuniu os amigos e gravou o seu primeiro disco como artista solo, uma das jóias perdidas do rock.

Lançado em agosto de 1970, o clima de reunião entre amigos já estava estampado na contracapa, com todos os envolvidos na gravação e produção lado a lado, formando uma grande família. Esse clima está presente também na primeira faixa, a instrumental "Slunky", uma jam fenomenal que abre o álbum com o astral lá em cima.

O disco segue com o blues "Bad Boy" e com "Lonesome and a Long Way from Home", que servem de introdução para uma sequência absolutamente matadora. Começando com "After Midnight", a primeira versão de Clapton para uma canção de J.J. Cale (o mesmo autor de "Cocaine", um dos maiores sucessos de sua carreira solo), o LP segue com a bela acústica "Easy Now" e a clássica "Blues Power", uma das mais famosas canções do guitarrista e que contém também um de seus solos mais memoráveis. "Bottle of Red Wine" fecha o quarteto fantástico, com um boogie contagiante. O álbum segue mantendo o ótimo nível com "Lovin´ You Lovin´ Me", "Told You for the Last Time" e "Don´t Know Why", e fecha com a maravilhosa "Let It Rain", prima distante de "Layla" e "Bad Love".

A banda que gravou com Eric Clapton daria origem ao grupo que ele montaria na sequência, o Derek and The Dominos, e esteve ao seu lado por boa parte dos anos setenta, quando o deus da guitarra afundou de vez em seus problemas com drogas e bebidas.

O primeiro disco solo de Eric Clapton é obrigatório para quem gosta de música e mostra que o rock e o pop podem andar lado a lado, sim. E, junto do álbum ao lado dos Bluesbrakers de John Mayall, de Disraeli Gears do Cream, do único registro do Blind Faith e de Layla and Other Assorted Love Songs do Derek and The Dominos, mostra como um simples jovem londrino transformou-se em um dos maiores músicos da história.

Pra começar a ouvir: Wilco

15:54

Origem: 1994, Chicago, EUA

Formação clássica: Jeff Tweedy (vocal e guitarra), Nels Cline (guitarra), Pat Sansone (guitarra), Mikael Jorgensen (teclados), John Stirratt (baixo) e Glenn Kotche (bateria)

Músicos importantes que passaram pela banda: Jay Bennett (guitarra), Ken Coomer (bateria), Bob Egan (guitarra) e LeRoy Bach (piano)

Gênero: alt-country

Características principais: um dos nomes mais influentes do alt-country, gênero que une características do rock e da música country. As principais características da banda são as canções repletas de feeling e melancolia

Fase áurea: 1996 a 2007

O clássico: Yankee Hotel Foxtrot (2002)

Discos imperdíveis: Being There (1996), Mermaid Avenue (1998, com Billy Bragg), Summerteeth (1999), A Ghost is Born (2004) e Sky Blue Sky (2007)

Ouça também: A.M. (1995), Mermaid Avenue Vol. II (2000, com Billy Bragg), Wilco (The Album) (2009) e The Whole Love (2011)

Álbum ao vivo recomendado: Kicking Television: Live in Chicago (2005)

Compilações recomendadas: Mermaid Avenue: The Complete Sessions (2012, com Billy Bragg), Alpha Mike Foxtrot: Rare Tracks 1994-2014 (2014) e What’s Your 20? Essential Tracks 1994-2014 (2014)

Ghost revela capa, título e tracklist de seu novo disco

10:07

A banda sueca Ghost revelou mais informações sobre o seu terceiro disco, que se chamará Meliora. O álbum será lançado dia 21 de agosto pela Loma Vista Recordings e foi produzido por Klas Ahlund (guitarrista da banda sueca Teddybears) e mixado por Andy Wallace (Slayer, Nirvana, Guns N’ Roses).

Meliora terá dez faixas, e o primeiro single, “Cirice”, será disponibilizado nos próximos dias. A banda também apresentará ao público novas máscaras e a nova encarnação de seu vocalista, agora chamado Papa Emeritus III.

Abaixo está o tracklist completo do disco:

1 Spirit
2 From the Pinnacle to the Pit
3 Cirice
4 Spöksonat
5 He Is
6 Mummy Dust
7 Majesty
8 Devil Church
9 Absolution

10 Deus in Absentia

quinta-feira, 28 de maio de 2015

John Lennon, U2 e Larry Norman: a trilogia “God"

18:39

“God” é uma das canções mais emblemáticas de John Lennon. Presente em Plastic Ono Band (1970), primeiro álbum solo após ele deixar os Beatles, marcou época por sua letra, onde o compositor lista uma enormidade de pessoas, crenças e sentimentos em que não acredita.

É preciso contextualizar o momento pelo qual John estava passando quando gravou o álbum e a canção. Após sair dos Beatles, conheceu o trabalho do psicólogo norte-americano Arthur Janov através de uma cópia do livro The Primal Scream, enviado pelo próprio Janov para o casal Ono Lennon. Yoko e John leram a obra e ficaram interessados no trabalho de Janov, que viajou a Londres para encontrar pessoalmente a dupla e apresentá-los a sua abordagem. John e Yoko ficaram fascinados pelo método, e decidiram ir para Los Angeles para realizar um tratamento na clínica de Janov.

A terapia do grito primal desenvolvida por Arthur Janov prega que o indivíduo deve expressar e colocar para fora todos os sentimentos que o atormentam, para assim conseguir se livrar deles e alcançar, consequentemente, a cura. Levando ao pé da letra os ensinamentos de Janov, John Lennon começou a escrever canções que seguiam essa linha de pensamento, e o resultado foi apresentado ao mundo em Plastic Ono Band. Lançado em 11 de dezembro de 1970, o disco traz algumas das canções mais famosas e pessoais de Lennon, incluindo “Mother" (onde fala da relação com Julia, sua mãe), “Isolation”, “Working Class Hero” e “God”. 

Esta última causou enorme discussão e controvérsia quando foi lançada, pois continha uma letra abertamente anti-religião e um longo discurso onde John gritava ao mundo a lista de personalidades, crenças e sentimentos nos quais não acreditava, fechando com a famosa frase “the dream is over”, adotada como lema pelos milhões de Beatlemaníacos de todo o planeta após o fim da banda inglesa.

O verso inicial de “God" tem John Lennon afirmando que “Deus é um conceito pelo qual medimos nossa dor”, frase que é repetida pelo artista para reafirmar o seu ponto de vista. Após essa introdução, o Beatle declama a sua famosa lista de “don't believes”, citando, em sequência, a magia, I-Ching, a bílbia, o tarô, Hitler, Jesus, John Kennedy, Buda, Mantra, Gita, a ioga, reis, Elvis Presley, Bob Dylan e, finalmente, os Beatles. Para então afirmar, de maneira clara e eloquente, que só acredita em si mesmo e em Yoko. A parte final é um dos mais belos momentos do Lennon letrista, onde John canta que “essa é a realidade, o sonho acabou, o que posso dizer?”, completando que “antes eu era um apanhador de sonhos, mas agora renasci, antes eu era a morsa (em alusão à canção “I Am the Walrus”), mas agora sou apenas John”, fechando com um pedido: “Então, caros amigos, você precisam continuar, o sonho acabou”.

O impacto de “God" foi enorme na cultura pop. A frase “I don’t believe in Beatles, I just believe in me” está em um dos diálogos do filme Curtindo a Vida Adoidado. David Bowie cita a canção em “Afraid”, faixa do disco Heathen (2002), afirmando que “I believe in Beatles”. Há diversas referências em peças de teatro, canções, filmes, livros, artigos de revistas e o que mais se possa imaginar. 


No entanto, duas das consequências mais interessantes de “God" estão na forma de canções que são uma espécie de resposta para a música de John. A mais conhecida é “God Part II”, gravada pelo U2 no álbum duplo Rattle and Hum (1988). Seguindo a mesma estrutura lírica de Lennon, mas com outra melodia, Bono homenageia Lennon cantando na letra as suas crenças e revela aquilo em que não acredita. Fica clara a visão religiosa de Bono, natural de um país com uma tradição religiosa tão forte e presente quanto a Irlanda, com o cantor do U2 iniciando a canção afirmando que não crê no demônio e em seu livro, que não acredita em excessos, nos ricos, no corredor da morte, na cocaína e em uma série de outras coisas, e que acredita somente no amor. A letra de “God Part II” contém também uma alusão direta a “Instant Karma”, outra canção de John Lennon, usada em um verso que critica o escritor norte-americano Albert Goldman e sua blasfêmia, referindo-se ao livro As Vidas de John Lennon, obra que causou muita polêmica e discussão ao revelar ao mundo os supostos problemas pessoais, os vícios e a personalidade extremamente difícil de Lennon.


Porém, o ataque mais direto ao clássico de John está em “God Part III”, faixa composta e gravada pelo norte-americano Larry Norman, um dos pioneiros do rock cristão. A música está em Stranded in Babylon, disco lançado por Norman em 1991. Seguindo uma melodia semelhante à canção original, Norman dispara contra John e os Beatles sem dó nem piedade. A letra já começa com um sonoro “I don’t believe in Beatles, I don’t believe in rock”, para depois polemizar com a frase “você pode facilmente abater o número 1 com uma bala”, uma clara referência ao assassinato de Lennon, em 8 de dezembro de 1980. As críticas à trajetória de John seguem, com Norman afirmando que “não acredita na revolução ou em palavras vazias sobre a paz”, referindo-se ao clássico “Revolution”, dos Beatles, e à “Imagine”, “Give Peace a Chance” e a cruzada de John e Yoko pela paz em todo o mundo no início da década de 1970, quando o casal concedeu diversas entrevistas em uma cama de hotel. O ápice da canção é uma antítese à letra de Lennon, com Norman cantando repetidamente o verso “I believe in God”. 

Controvérsias e discussões à parte, o fato é que a genialidade de John Lennon tem um dos seus pontos mais brilhantes em “God”. O mesmo pode-se dizer do U2, que em sua homenagem ao Beatle concebeu uma das suas mais fortes - e, de maneira controversa, menos conhecidas - canções. Em relação a Larry Norman, o que temos é uma típica letra pregando a sua crença, algo predominante na maioria de suas canções. 

Na pequena playlist abaixo, você pode ouvir as três faixas e também a versão de "God” gravada pela banda norte-americana Jack’s Mannequin com a participação do lendário Mick Fleetwood (do Fleetwood Mac) para o álbum tributo Instant Karma: The Amnesty International Campaign to Save Darfur.

The Atomic Bitchwax - Gravitron (2015)

15:40

Quando o hard rock surgiu na virada dos anos 1960 para 1970, ele era hard mesmo. O som de bandas como Led Zeppelin, Cactus, Uriah Heep, Cream, Deep Purple, Hendrix e outros pioneiros da pauleira era pesado, áspero, duro, cortante e penetrante. Não havia nada de sutil naqueles riffs, nada de delicado naqueles vocais, nada de discreto naquelas batidas. E foi justamente o contraste entre esse som novo e perturbador e a delicadeza, positivismo e sensibilidade do pop de então que fez com que o gênero se popularizasse, conquistando corações e mentes em profusão.

Porém, durante a década de 1980, o hard sofreu uma transformação e passou a soar mais adocicado. A cena norte-americana, que teve o seu epicentro em Los Angeles, deu ao mundo uma nova geração de bandas que aproximou o hard do pop ao mesmo tempo em que ostentava figurinos chocantes e de gosto duvidoso. Apresentando influências principalmente de Led Zeppelin e Aerosmith - pai e mãe do Guns N’ Roses -, nomes como Ratt, Mötley Crüe, Bon Jovi e outros, cada uma a sua maneira, colocou o seu tijolo na construção do que uns chamam de glam metal e outros preferem definir como hard farofa. E a partir de então, o termo hard rock passou a ter um significado dúbio, variando o seu entendimento conforme o gosto pessoal e a geração de cada indivíduo.

Mais recentemente, uma nova leva de bandas tem retomado os ensinamentos dos pioneiros dos anos 1970 e voltou a fazer o hard soar novamente direto, pesado e sem frescuras. É o caso dos grupos de stoner da década de 1990, e de nomes mais recentes como Graveyard, Rival Sons, Kadavar, Scorpion Child e afins. 

Os norte-americanos do The Atomic Bitchwax já são veteranos na estrada. A banda surgiu em Nova Jérsei em 1993, e desde então o trio lançou uma bela sequência de discos. O mais recente, Gravitron, saiu no final de abril e é, sem dúvida, um dos melhores trabalhos do grupo. Após um silêncio de quatro anos, a banda formada por Chris Kosnik (vocal e baixo), Finn Ryan (guitarra e vocal) e Bon Pantella (bateria) retornou com um trabalho furioso, que exala uma fumaça com cheiro suspeito.

Gravitron possui dez faixas espalhadas por pouco mais de meia hora de música. É energia pura, em uma atitude quase punk, que faz com que o hard dos caras soe urgente e agressivo, como deve ser. Não há espaço para enrolação. As canções são curtas - a mais longa não chega a cinco minutos - e vem com uma performance inspirada, com versos que desembocam em refrãos interessantes e nos onipresentes solos de guitarra. E, quando não sentem necessidade de colocar uma letra, os rapazes entregam faixas instrumentais mesmo, onde as palavras soam totalmente desnecessárias - casos de "Fuckface" e "War Claw", por exemplo.

É bom demais, e muitas vezes extremamente necessário, colocar os ouvidos em discos como esse. O mundo anda muito correto, muito certinho, muito coxinha, e é preciso sujar um pouco as coisas. O The Atomic Bitchwax foi feito na medida pra quem quer uma música onde o que mais importa, sempre e sem dúvida, é o peso, a pauleira, pura e simples. Se essa é a sua praia, está aí um dos grandes álbuns do ano.

Dicas de HQs pra quem quer começar a ler quadrinhos

12:52

Há muito tempo, as histórias em quadrinhos deixaram de ser uma mídia direcionada apenas para o público infantil e juvenil. O surgimento e a popularização dos super-heróis através das duas maiores editoras de HQs do planeta, a Marvel e a DC, fez com que o público leitor crescesse e se desenvolvesse junto com as histórias. Hoje, uma história dos X-Men, por exemplo, traz assuntos e tópicos que não fazem parte do universo de uma criança, e estão muito mais alinhados com o que acontece no mundo de maneira geral, discutindo preconceito, sexualidade, violência e discriminação. E esse caminho é facilmente percebido em outros títulos, que há muito deixaram de lado o universo de inocência e conto de fadas direcionado às crianças e exploram temas muito mais pesados e complexos.

Leio e coleciono quadrinhos desde sempre. A paixão pelas histórias é similar e surgiu mais ou menos na mesma época que o amor pela música. Ou seja, dá pra colocar aí na conta uns trinta anos lendo quadrinhos. E a transformação também foi semelhante, com o início nas antigas edições da Abril em formatinho, responsáveis por me formar como leitor, e a posterior migração para as edições encadernadas e de luxo lançadas pela Panini, Devir, Dynamite, Pixel e a própria Abril. Hoje, meu acervo de HQs é formado exclusivamente por edições encadernadas, que reúnem em um mesmo volume diversos números lançados originalmente de forma mensal, formando arcos fechados de histórias.

Abaixo, listei alguns títulos marcantes e de inegável qualidade, com o objetivo de apresentar a quem ainda não mergulhou no universo das HQs, ou possui a visão errada de que a mídia se destina apenas a títulos como Mônica e afins, tramas inteligentes, criativas e indicadas aqueles que querem dar os seus primeiros passos por esse mundo cheio de aventuras e personagens apaixonantes.

Batman: A Piada Mortal

Publicada em março de 1988, Batman: A Piada Mortal é uma das histórias mais emblemáticas e marcantes já lançadas. Escrita por Alan Moore e ilustrada por Brian Holland, apresenta em sua trama um Coringa não apenas enlouquecido, mas sedento por sangue e violência. O palhaço serial killer foca suas ações na família Gordon - no Comissário James e em sua filha, Barbara, também conhecida como Batgirl -, e literalmente quase enlouquece ambos, cometendo atos que marcariam para sempre o universo de Gotham City. A sequência final, quando Batman confronta o Coringa em um parque de diversões abandonado e macabro e se dá conta de que é mais parecido com o vilão do que gostaria de admitir, é um dos momentos mais clássicos das HQs contemporâneas. 

A Liga Extraordinária

Esqueça o filme lançado em 2003. Ainda que baseado na HQ, a aventura no cinema é muito inferior aos quadrinhos escritos por Alan Moore e ilustrados de maneira brilhante por Kevin O’Neill. Publicada a partir de 1999, A Liga Extraordinária traz personagens clássicos da literatura reunidos em uma equipe especial formada para combater grandes vilões. Já foram publicados sete volumes, sendo que seis deles saíram no Brasil: A Liga Extraordinária Volume I, A Liga Extraordinária Volume II, A Liga Extraordinária Século 1910, A Liga Extraordinária 1969, A Liga Extraordinária 2009 e A Liga Extraordinária - Nemo: Coração de Gelo. O único que ainda não ganhou edição nacional foi Black Dossier. Entre os personagens, estão nomes como Allan Quatermain, Wilhelmina Murray, Orlando, Henry Jeckyll / Edward Hyde, Nemo e até mesmo um quase Harry Potter. Nos quadrinhos, a violência é muito mais explícita, além de a história explorar bastante os problemas pessoais dos personagens, como o vício de Quatermain. O sexo é outro aspecto marcante, formando uma trama que difere muito, como já dito, daquela adaptação pasteurizada que foi levado aos cinemas. Os dois primeiros volumes são excepcionais, enquanto os demais apresentam oscilações mas, no final das contas, também valem a pena.

X-Men: E de Extinção

O inglês Grant Morrison é um dos mais respeitados autores de quadrinhos, e é conhecido por conceber mudanças e inovações drásticas nas tramas que escreve, que invariavelmente acabam refletindo de maneira marcante na mitologia dos personagens. Em E de Extinção, Morrison revolucionou profundamente o universo mutante, inserindo uma nova personagem que se transformou em uma grande ameaça para o futuro dos X-Men. A solução encontrada por Charles Xavier para proteger não apenas os seus alunos, mas o próprio futuro dos mutantes, foi sair das sombras e se revelar para o mundo, e a trama conta a história de tudo isso. Contendo violência e genocídio, E de Extinção é uma história genial, de cair o queixo, e que mostrou ao mundo os X-Men como nunca vistos antes.

Camelot 3000

Lançada em 1982, Camelot 3000 foi escrita por Mike W. Barr e ilustrada por Brian Polland. O enredo conta a história de uma Inglaterra ameaçada por uma invasão alienígena no futuro, e cujo retorno do lendário Rei Arthur e sua corte passa a ser a única solução possível. Muito bem escrita e com uma trama cativante, além de extremamente cinematográfica, é de se estranhar como Camelot 3000 ainda não tenha recebido uma adaptação para o cinema.

Watchmen

A obra maior de Alan Moore ao lado do ilustrador Dave Gibbons, Watchmen veio ao mundo em setembro de 1986 e mudou de maneira definitiva a forma como os quadrinhos passaram a ser vistos. A história traz heróis mais alinhados com o cotidiano, com medos, anseios e fraquezas, em contraste com os deuses de outrora. Isso deu origem a toda uma leva de histórias que começaram a investir em situações mais reais, humanizando os super-heróis de maneira definitiva. Watchmen virou filme em 2009, com direção de Zack Snyder, e o resultado foi muito satisfatório, mantendo-se bastante fiel à trama original.

Preacher

Escrita por Garth Ennis, Preacher conta a história de Jesse Custer, um pastor que possui o poder de fazer com que qualquer pessoa o obedeça. Desiludido com Deus, resolve sair em busca do próprio, em uma cruzada por todo o território dos Estados Unidos, onde acaba cruzando com toda uma gama de personagens coadjuvantes irresistíveis. A série está sendo relançada no Brasil pela Panini, com diversos encadernados em capa dura nas bancas. Vale muito a pena.

O Reino do Amanhã

Influenciada pela impacto de Watchmen, a DC aplicou uma lógica semelhante em seus personagens clássicos, em uma história escrita por Mark Waid e ilustrada por Alex Ross. Em uma realidade dominada por toda uma nova geração de super-heróis, em que valores como ética e responsabilidade não são as maiores prioridades, é necessário o retorno de nomes emblemáticos como o Superman e sua turma para colocar tudo nos eixos novamente. As ilustrações de Ross, extremamente realistas, causaram um enorme impacto e fizeram escola.

Sandman

Neil Gaiman em sua obra clássica. Publicada entre janeiro de 1989 e março de 1996, traz a história de personagens como Destino, Morte, Sonho, Destruição, Desejo, Desespero e Delírio, contadas com imaginação soberba e textos inspirados. A história foi relançada recentemente aqui no Brasil, em longos sete volumes com acabamento de luxo. Um dos momentos mais altos e brilhantes da história dos quadrinhos.

O Cavaleiro das Trevas

Frank Miller dá a sua versão para o universo do Batman, em uma história cheia de violência e crítica social. Lançada no início de 1986, O Cavaleiro das Trevas é a referência maior para a construção da imagem moderna do Batman, deixando de lado o pitoresco personagem humorístico da série de TV dos anos 1960 e transformando-o em um homem profundamente sombrio e abalado pelos eventos de sua vida. Ao assumir o personagem nos cinemas, o diretor inglês Christopher Nolan baseou a sua versão nesta HQ e em Batman: Ano Um, também escrita por Miller, para redefinir Bruce Wayne e o Batman para toda uma nova geração.

Além destes, existem diversos outros títulos que podem servir de porta de entrada para quem quer descobrir toda a magia das HQs. Opções não faltam, e ao entrar em contato com esse universo, cada pessoa irá descobrir as suas histórias e personagens preferidos.

A corrupção, as prisões e o caos na FIFA

quarta-feira, 27 de maio de 2015

Pra começar a ouvir: Cream

18:41

Origem: junho de 1966, Londres, Inglaterra

Formação clássica: Jack Bruce (vocal e baixo), Eric Clapton (guitarra e vocal) e Ginger Baker (bateria)

Gênero: hard rock

Características principais: um dos pioneiros do rock pesado, o Cream teve vida curta (durou apenas quatro anos) e executava um hard rock com grande influência de blues, além de executar performances e jams que se tornaram lendárias. Foi a banda que consolidou Eric Clapton como um dos maiores guitarristas da história

Fase áurea: 1966 a 1969

O clássico: Disraeli Gears (1967)

Discos imperdíveis: Fresh Cream (1966), Wheels of Fire (1968) e Goodbye (1969)

Álbuns ao vivo recomendados: Live Cream (1970), Live Cream Volume II (1972), BBC Sessions (2003), Royal Albert Hall: London May 2-3-5-6 2005 e The Farewell Tour 1968 (2007)

Compilações recomendadas: Best of Cream (1969), Heavy Cream (1972), Strange Brew: The Very Best of Cream (1983), The Very Best of Cream (1995) e Those Were the Days (1997)

Carro Bomba - Pragas Urbanas (2015)

11:30

Ouvindo Pragas Urbanas, quinto álbum do Carro Bomba, o assunto volta à mente e suscita uma reflexão: por que o heavy metal cantado em língua portuguesa não tem um alcance maior no Brasil? A questão é pertinente e alimenta uma necessária discussão. 

Se olharmos para o cenário do pop rock, o que mais vemos são bandas cantando em português e alcançando grande sucesso com essa escolha. A história do rock brasileiro é assim. São poucos os nomes nascidos em nosso país que se aventuraram pela língua inglesa. Quando o assunto vai para o heavy metal, gênero onde está inserido o Carro Bomba, a coisa muda de figura e é exatamente o inverso: a tradição é compor em inglês (mesmo que macarrônico) em busca do sonho do sucesso e reconhecimento internacional.

Se o público nacional de rock, de pop, já está condicionado a consumir música cantada em português, porque o público de metal também não está? Falta divulgação para nomes com qualidade reconhecida, como é o caso do Carro Bomba e inúmeros outros (coloque aí Baranga, Project 46, Uganga e até mesmo nomes um pouco mais leves como Tomada, Pedra e várias outras bandas)? Se quem consome rock tivesse conhecimento do trabalho dessas bandas, não as abraçaria entre as suas preferidas? Provavelmente, sim. Ou o público de metal aqui no Brasil é preconceituoso com quem canta em sua própria língua e acaba discriminando, mesmo que de maneira inconsciente, as bandas que seguem esse caminho? Falta profissionalismo para os artistas? Falta uma estrutura mais forte de promoção e divulgação? Falta interesse do mercado em promover esse tipo de música? Ou não falta nada? O papo é longo, as possibilidades são várias.

Produzido pela dupla Heros Trench e Marcello Pompeu, respectivamente guitarrista e vocalista do Korzus, Pragas Urbanas traz uma sonoridade suja, pesada e bastante grave, que soa atual e alinhada com o que se faz no metal mundo afora. O disco tem nove faixas, todas composições próprias, e marca a estreia do baixista Ricardo Schevano (também do Baranga), irmão do guitarrista Marcello Schevano. Completam o time o vocalista Rogério Fernandes e o baterista Heitor Schewchenco.

A influência de Black Sabbath, sempre presente na sonoridade do Carro Bomba, segue forte, mas não é mais a característica dominante. Com anos de estrada, a banda soube variar e acrescentar outros elementos em sua música, que ficou mais variada e ainda mais interessante. Uma das canções do disco, batizada como “Thrash n’Roll”, pode ser usada como exemplo para tentar definir o som do Carro Bomba, dando uma ideia do que o ouvinte encontrará no álbum.

A banda equilibra composições onde essa já citada influência do Sabbath predomina, como a ótima “Arrastando Correntes” (que, em um exercício hipotético, não soaria fora de lugar em 13, último disco lançado pela banda de Tony Iommi e Ozzy Osbourne) e o hard blues “Mojo”, com outras onde o groove come solto e tempera o som, deixando-o ainda mais forte, como é possível perceber em “Máquina”, “Fuga”, “Fantasma" e na faixa-título. Há de se destacar o excelente trabalho de composição, com riffs fortes e refrãos que grudam na cabeça.

Ao final de Pragas Urbanas, percebe-se que não é pela falta de qualidade que o metal cantado em português ainda segue sendo a exceção, o ponto fora da curva, na playlist dos fãs brasileiros. Nivelado por cima em todos os aspectos (produção, execução, composição), este novo trabalho do Carro Bomba não apenas consolida a banda paulista como um dos principais nomes atuais do gênero aqui no Brasil, como é uma boa porta de entrada para quem quiser conhecer mais não só do trabalho do quarteto, mas também de toda essa cena de bandas pesadas que decidiram cantar em nossa própria língua.

Por experiência própria, garanto que vale a pena!

A guitarra de H.R. Giger, heavy metal como terapia e o cotidiano dos super-heróis

terça-feira, 26 de maio de 2015

Pra começar a ouvir: Pink Floyd

18:20

Origem: 1965, Londres, Inglaterra

Formação clássica: Roger Waters (baixo e vocal), David Gilmour (guitarra e vocal), Richard Wright (teclado) e Nick Mason (bateria)

Músico importante que passou pela banda: Syd Barrett (vocal e guitarra)

Gênero: prog rock

Características principais: um dos nomes mais importantes e influentes do rock progressivo. Entre as principais características da banda estão as letras críticas e ácidas, as longas suítes, os arranjos refinados e a guitarra cheia de personalidade de Gilmour

Fase áurea: 1967 a 1979

O clássico: The Dark Side of the Moon (1973)

Discos imperdíveis: The Piper at the Gates of Dawn (1967), A Saucerful of Secrets (1968), Atom Heart Mother (1970), Meddle (1971), Wish You Were Here (1975), Animals (1977) e The Wall (1979)

Ouça também: More (1969), Ummagumma (1969), The Final Cut (1983), A Momentary Lapse of Reason (1987) e The Division Bell (1994)

Álbuns ao vivo recomendados: Delicate Sound of Thunder (1988), Pulse (1995) e Is There Anybody Out There? The Wall Live 1980-81 (2000)

Compilações recomendadas: Relics (1971), A Nice Pair (1973), A Collection of Great Dance Songs (1981), Hits (1983), Shine On (1992), Echoes: The Best of Pink Floyd (2001), Discovery (2011) e The Best of Pink Floyd: A Foot in the Door (2011)

Kamelot - Haven (2015)

11:03

Uma mudança de vocalista pode mudar a história de uma banda. Pode puxá-la para cima e colocá-la em outro patamar, que foi o que ocorreu com o Deep Purple quando escolheu Ian Gillan para o posto de Rod Evans e com o Iron Maiden quando colocou Bruce Dickinson no lugar de Paul Di’Anno. Pode arruinar e jogar no lixo uma trajetória construída durante anos, comprometendo o futuro do grupo, como aconteceu com o mesmo Iron Maiden ao substituir Dickinson por Blaze Bayley ou com o Nightwish ao trocar Tarja Turunen por Anette Olzon. Ou pode alterar totalmente a identidade sonora do artista e fazê-lo ressurgir através da exploração de outros caminhos, como ocorreu com o Black Sabbath com a adição de Ronnie James Dio no lugar de Ozzy Osbourne e, mais recentemente, com o próprio Nightwish com a adição de Floor Jansen.

O caso do Kamelot, no entanto, é um pouco diferente das situações citadas no parágrafo anterior. A banda norte-americana galgou diversos degraus na hierarquia do heavy metal e conquistou o coração de uma quantidade significativa de fãs a partir da troca de seu vocalista original, Mark Vanderbilt, substituído pelo excepcional cantor norueguês Roy Khan. Com ele, gravou discos excepcionais como The Black Halo (2005) e Ghost Opera (2007), consolidando-se como uma das novas forças do power metal. No entanto, Khan decidiu deixar a banda em 2011, após a turnê do álbum Poetry for the Poisoned. E então, o futuro do grupo liderado pelo guitarrista Thomas Youngblood entrou em xeque.

No entanto, Thomas e sua turma souberam lidar com a situação como poucos. Em um processo relativamente ágil, rapidamente anunciaram um substituto para Roy Khan: o sueco Tommy Kaverik. E aqui entra um fator interessante: tanto visualmente quanto em relação ao seu timbre, Kaverik é bastante parecido com Khan. Uma espécie de clone escolhido a dedo, de maneira aparentemente consciente, e que é um dos responsáveis por fazer o Kamelot não perder o foco e manter a sua trajetória ascendente.

A estreia da nova formação aconteceu em 2012 com o lançamento de Silverthorn, disco que mostrou que a banda tinha total capacidade de seguir em frente com o mesmo nível de qualidade anterior. E essa certeza se consolida com Haven, décimo-primeiro álbum de estúdio do grupo, lançado no início de maio. Novamente produzido por Sasha Peth, colaborador de longa data dos norte-americanos e responsável pela produção de vários discos do grupo, incluindo o já clássico The Black Halo, Haven mostra o Kamelot seguindo com a sua evolução. Ao longo dos anos, o quinteto foi diminuindo o foco na velocidade e nas melodias, dois dos elementos essenciais do power metal, ao mesmo tempo em que adicionou características góticas somadas a arranjos criativos e mudanças de andamento em suas composições, construindo uma identidade própria e original. Essa postura se mantém em Haven, e segue sendo um dos diferenciais do metal moderno e atual do Kamelot.

O disco traz treze faixas e as participações especiais de Charlotte Wessels (vocalista do Delain), Troy Donockley (flautista e multi-instrumentista a serviço do Nightwish) e Alissa White-Gluz (vocalista do Arch Enemy). Uma tradição em se tratando do Kamelot, a adição de músicos convidados agrega qualidade ao trabalho, possibilitando a exploração de aspectos únicos. É o caso de “Under Grey Skies”, balada com acento étnico e que traz Wessels e Donockley dividindo os holofotes com a banda. Mas é a presença de Alissa que traz um impacto maior, com a moça colocando o seu timbre gutural e agressivo em “Liar Liar (Wasteland Monarchy)” e em “Revolution”, em contraste com a voz bela e cristalina de Kaverik.

O Kamelot, mais uma vez, tira o foco da velocidade pura e simples e foca seus esforços na construção de canções repletas de nuances e momentos distintos, o que dá uma dinâmica bastante variada para o álbum. Mantendo suas características principais e sabendo evoluir sem chocar os fãs, os norte-americanos mostram mais uma vez o porque de serem um ponto fora da curva no cenário do heavy metal.

Superior a Silverthorn, Haven reafirma a força deste novo capítulo na história do Kamelot, que se mantém criativo e soa renovado e cheio de energia em seu novo disco. Que siga assim pelos próximos anos!

A trilha mais perigosa do mundo, Lego no cotidiano e Tom Cruise e a cientologia

segunda-feira, 25 de maio de 2015

Metal forte e atuante: 10 discos lançados em 2015 que irão fazer a alegria de qualquer headbanger

16:50

Como vem acontecendo em todos os anos recentes, e heavy metal segue firme e forte em 2015. Grandes discos já chegaram às lojas este ano, mantendo e reafirmando o ótimo momento criativo do estilo, em seus mais variados gêneros. Pra atualizar o seu playlist e manter o ouvido antenado, listei abaixo dez excelentes discos lançados em 2015 e que irão fazer a alegria de qualquer headbanger.


Nossa aventura começa com Enki, sexto álbum da banda israelense Melechesh. O lance aqui é música extrema turbinada por elementos étnicos, metal adornado por características da música mediterrânea. Os riffs de guitarra trazem melodias orientais, os arranjos se desenvolvem através de elaboradas passagens instrumentais, tudo construído com muito talento e bom gosto. O resultado é um black metal que consegue unir com maestria peso, agressividade e melodia, além de soar original pra caramba.


Próxima parada: Noruega. O país que popularizou o black metal em sua faceta mais extrema no início dos anos 1990 segue com uma cena musical efervescente. E um dos fatores que mais chama a atenção é a quantidade de bandas que partiram do lado mais extremo da música pesada e foram adicionando elementos progressivos em suas sonoridades com o passar dos anos. Um dos casos mais notáveis é o do Enslaved. Disponível desde março, In Times, novo álbum da banda, dá um passo além em relação ao disco anterior, RIITIIR (2012), e soa ainda mais orgânico e redondo. A banda não chega ao extremo de um Opeth, por exemplo, que abandonou todo o seu lado death e se reinventou totalmente, mas sabe como usar com inteligência a riqueza do prog para acentuar a pluralidade de seu som.


Saímos do frio e vamos para a chuva, desembarcando na Inglaterra, terra do Napalm Death. Um dos pais do grindcore, o grupo natural de Birmingham sempre apresentou um espírito aventureiro em sua carreira, e mantém esta característica pra lá de sadia em seu novo álbum. Com uma capa sensacional e um conteúdo no mesmo nível, Apex Predator - Easy Meat é um arregaço sonoro de 40 minutos, cujas quatorze faixas estão entre os momentos mais altos da carreira do Napalm Death. Nos três anos que separam o novo álbum do anterior, Utilitarian (2012), a banda parece ter desenvolvido ainda mais o lado imprevisível de sua música, fazendo com que Apex Predator - Easy Meat soe a milhas de distância do que se faz atualmente no metal extremo.


Como não poderia deixar de ser, é obrigatório dar uma passada pela Suécia em uma matéria que fala sobre a cena atual do heavy metal em todo o planeta. Com uma enxurrada de ótimas bandas, o país escandinavo conhecido por suas belas loiras revela ao mundo outro excelente nome. O Tribulation lançou no final de abril o seu terceiro disco, The Children of the Night. A proposta do grupo é unir o metal tradicional ao death, e os nórdicos se saem bem em sua meta. A parte instrumental bebe diretamente na inesgotável fonte da New Wave of British Heavy Metal, com bastante melodia e riffs, enquanto os vocais mergulham fundo em guturais que não soariam fora de contexto em qualquer nome mais extremo. 


Unindo duas das mentes mais talentosas surgidas no metal na última década, o The Gentle Storm é uma colaboração entre a vocalista holandesa Anneke van Giersbergen (ex-The Gathering) e o guitarrista (também holandês) Arjen Anthony Lucassen, conhecido pelo seu trabalho no Ayreon, Star One e outros projetos. O disco de estreia,The Diary, é duplo e traz dez faixas, sendo que no primeiro CD elas são interpretadas com arranjos e instrumentos que remetem à Idade Média, enquanto no segundo as mesmas canções recebem o tratamento tradicional do heavy metal, com guitarra, baixo e bateria. A sensação, em alguns momentos, é de estarmos em uma cerimônia em Porto Real patrocinada pelos Lannisters, embalada por belas composições que tem como destaque principal a voz de Anneke. Um disco um tanto inusitado e diferente, e por isso mesmo tão bom.


Também tendo uma voz feminina à frente, o Royal Thunder vem dos Estados Unidos e trilha por outra praia. O negócio aqui é um stoner às vezes mais metal e em outras mais psicodélico. O disco de estreia, CVI, foi lançado em 2012 e deixou meio mundo de boca aberta. O novo, Crooked Doors, saiu em abril e coloca elementos de doom e classic rock no caldeirão. As faixas se alternam entre momentos mais agitados e outros mais contemplativos, luz e sombra, e o timbre da baixista Miny Parsonz lembra um pouco o de Ann Wilson, do Heart. 


Ainda na terra do Tio Sam, o Torche é um quarteto formado em 2004 e cujo quarto trabalho, Restarter, saiu no final de fevereiro. Pesadíssimo, o disco traz um stoner com toques de doom, amparado por uma parede de guitarras praticamente intransponível. Aliás, o timbre alcançado pelos caras é digno de estudo, com as guitarras soando de uma maneira que poucas vezes você já ouviu. Cuspindo riffs em profusão, o Torche soa como uma esmagadora máquina que despeja toneladas de distorção, e o resultado é um álbum indicadíssimo pra quem não vive sem o peso nosso de cada dia.


Voltando pra Noruega, o Solefald é um duo na ativa desde 1995 e que construiu a sua carreira pelos lados do metal avant-garde, com experimentações e inovações constantes. World Metal: Kosmopolis Sud, lançado em fevereiro, é um álbum sem restrições, sem preconceitos e com muita criatividade, que vai do metal à música eletrônica, do jazz ao pop, tudo ao mesmo tempo e agora. Mais que um disco, um exemplo de que tudo é possível e permitido quando o talento é forte e a inovação, onipresente.


E tem o thrash metal, é claro. O Angelus Apatrida é um grupo espanhol formado em 2000, que pratica um thrash vigoroso e com riffs cavalares. Hidden Evolution, seu quinto álbum, saiu em janeiro mas não foi muito comentado aqui no Brasil, então vale a dica. Dosando com eficiência a pegada oitentista que está no DNA do thrash mas sem abrir mão de elementos mais atuais, a banda consegue produzir uma música cativante, daquelas que fazem bater cabeça sem querer e de maneira constante. O timbre vocal faz lembrar um pouco as lendas alemãs Kreator e Destruction, mas os espanhóis são donos do seu destino e tem personalidade própria.


Fechando o papo, temos o veterano vocalista norueguês Jorn Lande em sua mais nova jornada. Gravado ao lado do guitarrista Trond Holter (Wig Wam), Dracula: Swing of Death é uma ópera-rock sobre o lendário vampiro, presente no imaginário de todo fã de histórias de terror e fantasia. Fazendo uma comparação com um projeto similar, o Avantasia de Tobias Sammet, o que temos é um trabalho mais focado no hard rock e menos no power metal, onde o destaque são os sempre ótimos vocais de Lande e os inspirados riffs de Holter. As canções são fortes e bem desenvolvidas, fazendo com que o álbum garanta uma audição prazerosa durante toda a sua duração.

O certo é que, independente do estilo e da sonoridade, o heavy metal vive um momento de grande inspiração em todo o mundo. Nos últimos anos, fomos presenteados com excelentes discos como The Hunter (2011) e Once More ‘Round the Sun (2014) do Mastodon, Unto the Locust (2011) do Machine Head, Yellow & Green (2012) do Baroness e muitos outros. A julgar pelo andar da carruagem, 2015 tem tudo pra seguir no mesmo caminho, comprovando não apenas o excelente momento criativo vivido pelo estilo mas, principalmente, nos dando a certeza de que o futuro do gênero está seguro e bem servido de ótimos nomes.

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